quinta-feira, março 25, 2010
Sting e Raoni, Reencontro de Velhos Amigos.
Sting e Raoni, Bons e Velhos Amigos.
Após 20 anos, o cantor britânico Sting e o cacique kayapó, Raoni reuniram-se em São Paulo no final do ano passado. O objetivo dessa reunião, a construção da hidrelétrica de Belo Monte, a mesma razão que os uniu pela primeira vez, em fevereiro de 1989, em Altamira, no Pará. Foi um reencontro bastante emocionado de dois velhos amigos.
O cantor Sting, ex-líder da banda The Police, e o líder dos índios kayapó Raoni, abraçaram-se em São Paulo e conversaram sobre a questão da construção hidrelétrica de Belo Monte (principal obra do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC – do governo federal).
O mesmo motivo que os uniu há vinte anos e ainda em pauta, já que a licença prévia para a usina foi concedida em início de 2010. Nessa ocasião, eles receberam a imprensa para uma coletiva, e na mesma noite, Raoni cantou junto com Sting, em show que o cantor fez na cidade de São Paulo.
Em 1989 como hoje, os povos indígenas da região não querem a hidrelétrica, por representar inúmeros impactos contra eles e também aos ribeirinhos. Em 1989, assim como hoje, as populações tradicionais têm a mesma queixa: não estão sendo ouvidas nem consultadas.
Uma decisão que só depende do povo brasileiro!
Quando aqui esteve, Sting afirmou durante uma coletiva, que a decisão de construir
Belo Monte é do povo brasileiro e que ele, como estrangeiro, só poderia reforçar a importância de que todos os brasileiros precisam ser ouvidos. “Governo não conversou com índio”, disse o líder kayapó Megaron, sobrinho de Raoni, presente ao encontro. “Índio não sabe o que é audiência pública. Pensa que é ir lá para brigar”, afirmou.
“Governo não sabe ouvir índio. Lula quer usar seu poder para fazer Belo Monte de qualquer jeito”. O cacique Raoni, falando em língua kayapó, lembrou de quando foi condecorado por Lula. "Quando o presidente me deu medalhas eu perguntei se ele ia assinar a barragem”.
“Ele disse que não ia assinar. Mas ele nunca nos juntou para discutir sobre a barragem. Por isso fico preocupado. Será que ele vai assinar"? E depois mandou um recado pela imprensa presente: "Não quero barragens no Rio Xingu. Espalhem isso".
Raoni na época também fez questão de dizer “os kayapós querem paz para seus filhos e netos, nosso povo está crescendo, e vive da caça e da pesca de peixe. Quero comida para meu povo”, disse o cacique.
Belo Monte na ONU
O Pop Star e Presidente Rainforest Foundation,Sting, e o cacique e chefe Kayapó, Raoni, em conversa com Jornalistas.
Sting contou aos jornalistas que sua mulher Trudie - com quem fundou a ONG Rainforest US em 1989, - Organização não governamental em defesa das florestas – após ter participado do encontro de Altamira, havia falado na Assembléia Geral da ONU, onde contou a história de Raoni e o caso da hidrelétrica de Belo Monte.
"Há 20 anos eu tinha a intuição de que a floresta era importante para o planeta e há algum tempo a ciência comprovou isso”. Sting relembrou a viagem que fez com Raoni a muitos países do mundo divulgando a importância de demarcar os territórios indígenas e levando o protesto dos indígenas contra a construção de Belo Monte.
O primeiro projeto da Rainforest recém-criada foi apoiar o reconhecimento oficial da Terra Indígena Mekragnoti, Kayapó. Em 1991, a TI foi demarcada.Na década de 1990, a Rainforest passou a apoiar projetos no Parque Indígena do Xingu, em parceria com o ISA – Instituto Socioambiental.
Entre esses projetos, a Rainforest sociabiliza o monitoramento dos limites do Parque para prevenir invasões e apóia o desenvolvimento de um sistema de educação bilíngue em 14 etnias que ali vivem, estimulando o desenvolvimento sustentável e apoiando a Associação Terra Indígena do Xingu (Atix).
O Parque Indígena do Xingu é hoje uma ilha verde preservada no coração do Mato Grosso, pressionada de todos os lados pela expansão da fronteira agrícola.
Também no caso dos índios Panará, a Rainforest Foundation e o ISA desempenharam papel fundamental no retorno desse povo ao seu território ancestral, em 1996, 25 anos depois de um exílio forçado no Parque do Xingu para onde foram levados após quase terem sido totalmente dizimados pela construção da BR 163, rodovia que liga Cuiabá a Santarém, na década de 1970. Os Panará também obtiveram uma vitória histórica, em 2003, ao serem indenizados pelo governo brasileiro por decisão da Justiça.
Raoni convidou Sting para participar da inauguração da nova aldeia Kayapó, que acontecerá em abril desse ano. O cantor disse que fará o possível para estar presente, quando ele também trará Trudie, sua mulher.
O Encontro de 1989
O ISA sempre acompanhou de perto os debates sobre Belo Monte. Já em 1988, por meio do Programa Povos Indígenas no Brasil; do Centro Ecumênico de Documentação e Informação (Cedi), uma das organizações que deu origem ao Instituto Socioambiental (ISA), a instituição denunciou os planos de construir hidrelétricas e outras obras de infraestrutura na Amazônia, sem consulta aos povos indígenas, e mobilizou a opinião pública contra essa arbitrariedade.
Para avançar na discussão sobre a construção de hidrelétricas, as lideranças kaiapó reuniram-se na aldeia Gorotire em meados de 1988 e decidiram pedir explicações oficiais sobre o projeto hidrelétrico no Xingu, formulando um convite às autoridades brasileiras para participar de um encontro a ser realizado em Altamira (PA).
A pedido do líder indígena Paulo Paiakan, o antropólogo Beto Ricardo e o cinegrafista Murilo Santos, do Cedi, participaram dessa reunião, assessorando os kaiapó na formalização, documentação e encaminhamento do convite às autoridades.
Na seqüência, eles uniram-se aos kaiapó na preparação do evento. O encontro finalmente aconteceu e o Cedi, com uma equipe de 20 integrantes, reforçou sua participação no encontro.
Ao longo desses anos, o Cedi, e após o ISA, acompanharam os passos do governo e da Eletronorte na questão de Belo Monte, e os impactos que provocaria sobre as populações indígenas, ribeirinhas e todo o ecossistema da região.
O I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu acabou ganhando imprevista notoriedade, com a maciça presença da mídia nacional e estrangeira, de movimentos ambientalistas e sociais e do cantor Sting, na época líder da banda The Police, que é sucesso até hoje embora tenha se dissolvido.
Cerca de três mil pessoas participaram do evento, entre elas 650 índios de diversas partes do país e de fora, lideranças como Raoni, Marcos Terena, Paulo Paiakan e Ailton Krenak; autoridades como o então diretor da Eletronorte, e hoje presidente da Eletrobrás, José Antônio Muniz Lopes, o então presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Fernando César Mesquita, deputados federais; 300 ambientalistas, e cerca de 150 jornalistas.
Imagem da India Tuíra, ao ameaçar então diretor da Eletronorte, e hoje presidente da Eletrobrás, José Antônio Muniz Lopes.
Foi nessa ocasião que a índia Tuíra, prima de Paiakan, levantou-se da platéia e encostou a lâmina de seu facão no rosto do diretor da estatal num gesto de advertência. A cena correu o mundo, reproduzida em jornais de diversos países e tornou-se histórica.
O evento foi encerrado com o lançamento da Campanha Nacional em Defesa dos Povos e da Floresta Amazônica, exigindo a revisão dos projetos de desenvolvimento da região, a Declaração Indígena de Altamira e uma mensagem de saudação do cantor Milton Nascimento. O encontro de Altamira é considerado um marco do socioambientalismo no Brasil.
Mas de lá prá cá, a falta de diálogo continuou a irritar as tribos indígenas da região. Em Junho de 2008, o engenheiro da Eletrobrás Paulo Fernando Rezende, foi atacado pelos índios, sofrendo ferimentos.
Em seu discurso ele disse:“Em 2017, haverá cerca de 204 milhões de pessoas no Brasil, todos têm de ter energia. Eu moro no Rio de Janeiro. Para mim não vai faltar. Vai faltar para vocês.” A fala gerou vaias e indignação.
Ao terminar sua apresentação, ele foi cercado por indígenas armados de facões e bordunas, tendo sido espancado, quando sofreu um corte no braço direito.
É enorme o histórico de agressões contra os povos da floresta e moradores de regiões ribeirinhas, que se posicionam contra a construção da Usina de Belo Monte, o que representa a falta de diplomacia do governo brasileiro em fomentar o diálogo entre os orgãos competentes e as etnias que vivem a centenas de anos naquela região, e ali construíram o seu habitat, e dependem 100% dos recursos naturais disponíveis.
Numa era onde o Brasil desponta como o precurssor nas questões racionais, podendo estabelecer inúmeras alternativas de Energia, a exemplo da Eólica, uma das mais limpas do mundo, e não provoca consideráveis impactos ambientais; num momento onde o Brasil, pode vir a ponderar junto as organizações internacionais, sobre formas sustentáveis de desenvolvimento, vimos um retrocesso no fomento as políticas ambientais nacionais, não contemplando as questões que envolvem as populações indígenas e ribeirinhas, populações essas das mais vulneráveis.
Os Povos da Floresta merecem serem ouvidos, e seus direitos garantidos.
Fonte: ISA - Instituto SocioAmbiental/InêsZanchetta
Leia a Carta de Belo Monte, encaminhada ao Presidente Lula por 140 entidades de todo o Planeta no site Brasil Econews, clique no link.
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